Os prêmios.
Cortazar escreve este seu segundo romance publicado em 1960,
antes do Jogo da Amarelinha. Ao longo das 164 páginas assistimos em tempo real os
três dias que dura uma viagem em barco que termina de forma trágica.
O estilo.
Como é recorrente no estilo de Cortazar sempre existe um
“outro lado”, tudo é nebuloso. No livro os personagens ganham como recompensa
de um sorteio uma viagem em barco, mas eles não conhecem o destino do passeio e
ainda para alimentar o clima ambíguo dos fatos, os tripulantes, aparentemente
suecos ou finlandeses, não se comunicam com os passageiros e por esse
comportamento estranho recebem o apelido de glúcidos.
Mas o que provoca o núcleo dramático é que dentro do barco
os passageiros não podem passar da proa para a popa, este fato faz que eles nutram
pareceres imaginários desse outro lado desconhecido e este é justamente o
conflito que alimenta o ritmo narrativo.
Como acontece no conto “A casa tomada”, não existe um perigo
real, apenas uma ameaça ou uma interdição que provoca a fantasia dos
passageiros e que precipita o final trágico.
A trama.

A narrativa não tem um protagonista único, são vários os
personagens, eles se apresentam em duplas: o casal Nora e Lucio na sua intimidade;
Claudia com seu filho Jorge, Gabriel Medrano e Persio, Raul e Paula; o senhor
Trejo e Felipe, Nelly e sua mãe (dona Pepa) , Pelusa ( Atilio Presutti), Carlos
Lopez, o doutor Rastelli e Don Galo.
Os passageiros são impedidos de circular livremente pelo
barco devido a um rumor de tifus; isto provoca que um grupo decida romper o
cerco e invade a parte proibida do barco; ocorre um enfrentamento, morre um dos
tripulantes e um passageiro. A viagem é irrompida pela polícia que impõe que o
relato oficial oculte a morte do passageiro. Alguns se revoltam com a
falsidade, mas acuados aceitam a versão oficial e voltam a suas vidas normais.
Persio.
Um dos personagens mais originais é o Persio,
ele funciona como uma espécie de pretexto para que Cortazar rompa o discurso
narrativo e se permita entrar em um território mais livre, em outra dimensão
como o próprio autor confessa. Aqui
alguns dos seus monólogos:

Ou: “Conozco
los olores de la calle Paraguay, y también Godoy Cruz de Mendoza, donde la
brújula del vino corre entre gatos muertos y cascos de cemento armado. Hubiera
debido mascar coca en cada rumbo, exacerbar las solitarias esperanzas que la
costumbre relega al fondo de los sueños, sentir crecer en mi cuerpo la tercera
mano, esa que espera para asir el tiempo y darlo vuelta, porque en alguna parte
ha de estar esa tercera mano que a veces fulminante se insinúa en una instancia
de poesía, en un golpe de pincel, en un suicidio, en una santidad, y que el
prestigio y la fama mutilan inmediatamente y sustituyen por vistosas razones,
esa tarea de picapedrero leproso que llaman explicar y fundamentar. Ah, en
algún bolsillo invisible siento que se cierra y se abre la tercera mano, con
ella quisiera acariciarte, hermosa noche, desollar dulcemente los nombres y las
fechas que están tapando poco a poco el sol, el sol que una vez se enfermó en
Egipto hasta quedarse ciego, y necesitó de un dios que lo curara”.
Aquí um
trecho onde explora a imagem de um quadro de Picasso: “Tal vez sea necesario el reposo, tal vez en algún
momento el guitarrista azul deja caer el brazo y la boca sexual calla y se
ahueca, entra en sí misma como horriblemente se ahueca y entra en sí mismo un
guante abandonado en una cama. A esa hora de desapego y de cansancio (porque el
reposo es eufemismo de derrota, y el sueño máscara de una nada metida en cada
poro de la vida), la imagen apenas antropomórfica, desdeñosamente pintada por
Picasso en un cuadro que fue de Apollinaire, figura más que nunca la comedia en
su punto de fusión, cuando todo se inmoviliza antes de estallar en el acorde
que resolverá la tensión insoportable”.
A sedução.

Queria remarcar que é a primeira vez que me confronto com uma
descrição homossexual em Cortazar.
A organização interna.
Temos um Prólogo, depois começam a ser contados os dias da
viagem, assim temos o primeiro dia,. segundo, terceiro , um epilogo e uma nota do autor onde Cortazar comenta,
entre outras coisas, a falta de planos com a que foi construída a obra.
O romance abre com uma citação do
Idiota de Dostouevski: ”¿Qué
hace un autor con la gente vulgar, absolutamente vulgar, cómo ponerla ante sus
lectores y cómo volverla interesante? Es imposible dejarla siempre fuera de la
ficción, pues la gente vulgar es en todos los momentos la llave y el punto esencial
en la cadena de asuntos humanos: si la suprimimos se pierde toda probabilidad
de verdad”.
Final.
Cortazar experimenta a ruptura com o discurso “normal”
literário e se aventura em sequências aparentemente inspiradas nos surrealistas
ou no improviso do jazz.
O argumento nos apresenta uma historia simples, em aparência, mas detrás
da qual subjazem temas mais
profundos: O tema do desconhecido, aquilo que não podemos alcançar, também a
crítica ao patriotismo vazio, aos lugares comuns, ao temor da imagem social, ao
conformismo com os valores estabelecidos, a cobardia e a superficialidade, ao preço
que há que pagar por o valor ou por quebrar as grades.
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