Tlön, Uqbar, Orbis Tertius.
Esse é o título de um conto fantástico do autor
argentino Jorge Luis Borges.
Em apenas 12 páginas o autor consegue colocar idéias e imagens que confirmam sua imaginação genial.
É um relato, tipo diário, escrito em primeira pessoa que narra o
encontro com o planeta “Uqbar”, (“Tlön” é uma
da suas regiões) e “Orbis Tertius” a edição de 40 volumes sobre este universo ,
daí o título.
Em relação aos nomes
utilizados para o título : Uqbar é uma criação , existem interpretações que vem
no nome Tlön uma referencia com Atlântida e Orbis Tertius significa “um outro
lugar”, “terceiro mundo” ou “um planeta fora das opções conhecidas”. .
Um dos personagens do
conto (Buckley) sinaliza o caminho para
decifrar o labirinto: “Quer demonstrar ao Deus inexistente que os homens
mortais são capazes de conceber um
mundo”.
Com o relato Tlön, Uqbar, Orbis Tertius surpreendeu
,nos anos 40, a toda uma cidade portenha que nunca o esqueceu.
Sobre Borges.
Foi um dos mais importantes escritores
do século XX. Tímido e irônico amou a literatura inglesa, o livro das mil e uma
noites, o tango e ao Edgar Alan Poe por ele ter renovado, com a sua neurose, o
conto fantástico, um dos seus gêneros literários
preferidos.
Sua vida foi uma melancólica
caminhada pelas ruas portenhas e pelos temas existenciais : “ Só uma coisa não
há, é o olvido” diz Borges no poema Everness.
Ele foi um escritor pensador, Borges diz,
por exemplo, sobre o fato estético em
1950: “La música, los estados de la felicidad, la mitología, las caras
trabajadas por el tiempo, ciertos crepúsculos y ciertos lugares, quieren
decirnos algo, o algo dijeron que no hubiéramos debido perder, o están por
decir algo; esta inminencia de una revelación, que no se produce, es, quizá, el
hecho estético”.
Sobre Tlön,
Uqbar, Orbis Tertius.
Apareceu publicado pela
primeira vez no jornal argentino Sur em 1940. O enredo principal do conto é o
encontro com o além, a descrição desse outro mundo e a ingerência do mundo
fictício na realidade.
A criatividade.
Borges cria um mundo, uma linguagem, poesias, visões, idéias e cria um pretexto
(nos dos sentidos da palavra) para exercer a sua imaginação e ensaiar sobre
teorias filosóficas que o influenciavam.
Para isso cria todo um universo, um mundo que se desfaz assim que a
gente fechar a ultima pagina do curto relato.
Ainda assim por algum tempo ficamos pensando nos hrönir, no exemplo das moedas, nas visões do tempo e mais
que nada na capacidade do autor de recriar uma historia inacreditável que
ingressa no mundo da nossa imaginação.
O relato.
Borges junto
a seu amigo Bioy Casares assiste a cena de um espelho refletindo o volumem de
uma enciclopédia, Bioy Casares lembra
uma frase que atribui a um habitante de Ugbar: “os espelhos e a cúpula são
abomináveis por que multiplicam o numero dos homens”.
Esta frase teria sido expressada numa
enciclopédia num artigo sobre Uqbar. O estranho é que na enciclopédia a parte
dedicada a Uqbar é omitida na edição presente na cena do espelho, mas é achada
na edição que Bioy Casares encontra na sua casa um dia depois. Assim começa este conto meio policial, meio
fantástico e meio filosófico.
A forma e o conteúdo.
A história se divide em três momentos. Na primeira
seção, o narrador (em primeira pessoa) e seu amigo e colaborador, Adolfo Bioy
Casares, (amigo de Borges na vida real) protagonizam a cena do espelho e logo discutem
um hipotético “romance em primeira pessoa, cujo narrador omitiria ou
desfiguraria os fatos e se entregaria a várias contradições que permitiriam a
alguns leitores - muito poucos leitores - perceber uma realidade atroz ou banal
”.
A segunda seção descreve a descoberta , dois anos depois
(em 1937), do décimo primeiro volume de A primeira enciclopédia de Tlön , deixada em um bar pelo
um sombrio inglês, Herbert Ashe. A enciclopédia tem em sua primeira página
um oval azul estampado inscrito "Orbis Tertius", e descreve um
"vasto fragmento metódico de toda a história de um planeta
desconhecido", suas línguas, filosofia, ciência, matemática e
literatura.
As pessoas desse planeta imaginário são “congenitamente
idealistas” e não acreditam na existência material e objetiva de seus
arredores. Eles acreditam apenas no que eles próprios percebem e,
portanto, o “mundo para eles não é um concurso de objetos no espaço; é uma
série heterogênea de atos independentes. É sucessivo e temporal, não
espacial ”. Na linguagem, isso significa que não há substantivos para objetos
concretos, apenas agregados de adjetivos que descrevem o momento
imediato. Causa e efeito não se relacionam. Objetos são mantidos para
desaparecer fisicamente introduzindo o conceito de hrönir . Os Hrönir , são cópias imperfeitas de objetos que são
formados quando um objeto é perdido (este tema lembra um pouco as teorias do
seu amigo Macedonio Fernandez sobre os objetos esquecidos).
O pós-escrito da história é datado de 1947 (o conto foi publicado em
1940) e analisa o início e o impacto subseqüente de Tlön. Ele explica que
Tlön, Uqbar e Orbis Tertius foram a idéia de uma sociedade secreta de
especialistas de uma ampla gama de disciplinas (incluindo Herbert Ashe),
financiada pelo milionário Ezra Buckley., que convenceu a sociedade em 1824 a expandir seu
objetivo de inventar um país para inventar um mundo. Borges observa várias
"intrusões" de Tlön no mundo real, sendo a mais notável a descoberta
em 1942 de um artefato de Tlön na mão de um moribundo no povoado “Cuchilla Negra”; um pequeno cone de metal de
material desconhecido que era inexplicavelmente pesado . Borges acredita que a sociedade
secreta, propagada através do tempo, orquestrou a descoberta de vários
artefatos e documentos tlönianos, fazendo com que a realidade fosse tomada por
Tlön. Quando o conto de Borges termina em 1947, Tlön "desintegrou
este mundo. Encantada pelo rigor de Tlön, a humanidade esqueceu, e continua a
esquecer, que é o rigor dos mestres de xadrez, não dos anjos".
Parágrafos inesquecíveis.
Falando
sobre a linguagem em Tlön: ”Abundam os objetos ideais, convocados e
dissolvidos em um momento, segundo as
necessidades poéticas. Os determina, as vezes, a mera simultaneidade. Há
objetos compostos de duas partes, um de caráter visual e outro auditivo: a cor
do nascente e o remoto grito de um pássaro. Tem muitos: o sol e a água contra o
peito do nadador, o copo rosa tremulo que se vê com os olhos fechados, a
sensação de quem se deixa levar por um rio e também por um sonho”.
Sobre o
tempo: “o presente é indefinido, o futuro tem realidade só como esperança
presente, e o passado só tem realidade como lembrança presente”.
Esta
afirmação nos indica uma citação do Russell de 1921 onde ele supõe que o
planeta foi criado , faz poucos minutos, habitado por uma população que
“lembra” um passado ilusório.
Também algo
interessante é que em Tlön se acredita que todas as obras são de um só autor
que é atemporal e anônimo. Isto torna
desnecessário assinar a autoria e desfaz a idéia de plágio.
A frase mais conhecida
do livro é seguramente: "os
meta-físicos de Tlön não buscam a verdade nem sequer a verossimilhança: buscam o
assombro. Julgam que a metafísica é uma rama da literatura fantástica".
Esta ultima afirmação é um aforismo de autoria dos filósofos do circulo de
Viena.
Final.
Este conto
causou múltiplas interpretações e alimentou a imaginação pontual de uma Buenos
Aires desprevenida que acorda numa manhã de 1940 com a irrupção de Tlön na vida
corrente.
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