Electra.
Quando
escutamos falar de Electra vem na nossa memória o que nos chega desde a
psicanálise com Jung, o comportamento feminino de aproximação amorosa com o pai,
algo paralelo ao que se conhece como complexo de Édipo nos homens.
Na
realidade o mito de Electra narra a historia de uma jovem corajosa que assim
como o Hamlet de Shakespeare vinga uma traição que ocorre no seio da sua
família.
Este
mito teve inúmeros desdobramentos em infinidades de historias, desde Homero,
Eurípides até Ezra Pound na modernidade, filmes, operas... Hoje vamos nos deter
em três narrações onde a personagem histórica aparece na literatura: a trilogia
de Ésquilo chamada Oréstia estreada nos 458 A de C, a do Sófocles (28 anos mais
novo que Ésquilo) representada entre os anos de 410 a 417 A de C e a de Eugene
O´Neill de 1931 titulada “A Electra lhe cai bem o luto”.
O contexto.
A
historia de Electra esta inserida em um contexto que é necessário conhecer para poder se
adentrar no mito.
Temos
duas narrações por trás da historia central a primeira se refere à maldição dos
Atridas e a segunda esta associada com ao rapto de Helena.
A maldição dos Atridas.
Pêlops,
(Pélope) herói do Peloponeso veio da Ásia menor para casar na Grécia com Hipodâmia,
o pai dela Oenomaus desafiava os pretendentes a uma corrida desigual e sempre
ganhava.
Pêlops
compra Mirtilo, filho de Hermes ( Deus ardiloso
e embusteiro) , subordinado de Oenomaus, que retira uma peça da roda do
carro do seu amo para beneficiar ao desafiante. (cena lembrada na imagem ao
lado).
Assim
Pêlops que conseguiu seu objetivo de
modo fraudulento com a cooperação de Mírtilo, após usar os serviços trai seu
cúmplice e o joga no mar, este na hora de morrer lança uma maldição cujos
efeitos atingiriam toda a raça de Pélops.
Pelóps
teve dois filhos gêmeos: Atreu, também
citado como Atreo (de onde surge o nome para batizar a maldição) e Tiestes.
Ambos
tiveram uma disputa pelo trono de Micenas. Triestes se associou a mulher de
Atreu (Aerope) e roubo um carneiro com lã de ouro, que deveria segurar a seu
possuidor o trono cobiçado por ambos. Atreu, protegido por Zeus, foi rei apesar
disso.
Atreu
para se vingar da perfídia convidou seu irmão para um jantar no qual foi servida
de forma disfarçada a carne dos corpos de dois dos três filhos de Tiestes (o
sobrevivente se chamara Egisto).
Este
crime bárbaro reforça a maldição de Pelops e inaugura a dos Atridas. Existem diferentes versões, mas uma das mais
conhecidas afirma que Atreu tem dois filhos: Menelau ,marido de Helena e
Agamenon que casa Clitemnestra com a qual tem como filhos Ifigênia,
Crisotêmis,Orestes e Electra.
Finalmente
Egisto (filho sobrevivente de Tiestes) casa com Clitemnestra e juntos matam Agamenon.
Por fim Electra junto com seu irmão Orestes se vinga da morte do seu pai matando Egisto e Clitemnestra colocando fim na
maldição.
Rapto de Helena.
O
outro lado da historia pelo qual Clitemnestra mata Agamenon esta ligado com o
fato de Paris raptar Helena, esposa de Menelau,
Agamenon decide ajudar seu irmão para trazer Helena de volta dando inicio assim a guerra de Tróia.
A
historia narra que Agamenon esta acampado esperando bons ventos e seu exercito
começa se impacientar, consultado o Oráculo do porque os ventos não sopram
impedindo que as embarcações entrem no mar, este se refere ao crime de um
animal sagrado da deusa Artemis como acontecimento que provocara a falta de
ventos que estaria gerando a demora e diz que a ira da
deusa apenas poderia se acalmar com o sacrifício de Ifigênia (filha mais velha
de Agamenon).
Clitemnestra mata Agamenon então por um lado produto de um
ajuste de contas do destino como conseqüência da maldição dos Atridas e por outro
lado por conta de este ter sacrificado sua filha Ifigênia para poder sair no
mar em busca de Helena.
-0-0-0-0-
A Electra de Esquilo.
O
autor escreve uma trilogia chamada Oréstia para narrar os acontecimentos em
volta do mito de Electra.
Nada
menos que Goethe declara que esta tragédia é uma das maiores obras de arte da
literatura.
A
tragédia esta escrita em forma de versos e mostra a afinidade estreita do homem
com os deuses, a força do destino e inclui uma opulência de imagens que remetem
a mitos que enriquecem a narração. Esquilo escreveu a tragédia em três partes:
Agamenon, Coéforas e por ultimo Eumênides.
Agamenon.
A
primeira parte, chamada Agamenon, escrita basicamente desde a perspectiva de
Clitemnestra conta a chegada de Agamenon a Atenas.
Agamenon
chega depois da guerra de Tróia onde vai ser assassinado pela sua mulher e pelo
seu amante Egisto produto, como falamos da maldição dos Atridas , do sacrifício
de Ifigênia e do desejo do casal de ficar com o poder em Atenas.
Paralelo
ao drama central imagens pessimistas anunciam o desagrado dos Deuses com a
destruição da guerra, duas águias caçam uma lebre grávida o que estaria
simbolizando os ataques e a destruição que Tróia teria recebido da mão do
exercito grego que alem de resgatar Helena teria devastado toda uma
civilização.
A
narração na parte final do drama é contada desde o olhar de Casandra, irmã de
Paris, sacerdotisa de Apolo, trazida por Agamenon como troféu de guerra, vidente,
que a partir da suas premonições antecipa e narra sua morte e a do Agamenon.
O
coro tem um papel importante no discurso como observador e até participando ativamente no drama ao ponto de
levantar armas contra a cena do crime.
Aqui uma das falas de Casandra trazendo imagens da maldição dos Atridas e profetizando o fim do
Agamenon= parágrafo 1390: “Ai! Ai de mim! Desgraça! Torna a dominar-me o torvo turbilhão dos
ímpetos proféticos alucinando-me com seu refrão horrível! Estais também agora vendo junto à porta
frágeis figuras infantis fantasmagóricas iguais a formas espectrais em pesadelos? Parecem criancinhas
mortas por aqueles que deveriam dedicar-lhes todo o amor! As mãos repletas de sanguinolenta carne -
da própria carne (ai! confrangedora carga...), entranhas, vísceras que um monstruoso pai ousou, infame,
aproximar de sua boca! (1) Prevejo e vos declaro que um leão (2) covarde lá dentro premedita, no seu
próprio leito, vingança insidiosa contra meu senhor que volta (ai de mim... terei que suportar por toda
a vida o jogo da sobrevivência)” ..
(1) referencia ao jantar que Atreu servira a Tiestes,
(2) Egisto.
A primeira parte da trilogia termina então com a morte de Agamenon e Casandra por parte de
Clitemnestra Egisto.
Coéforas.
O
segundo drama da trilogia narra a chegada de Orestes para vingar seu pai (lembrando
que este tinha sido enviado para longe quando Egisto casa com Clitemnestra e
Electra passa a ser tratada como uma escrava dentro do seu próprio lar).
O
titulo de Coéforas faz alusão as mulheres que faziam libações fúnebres, no caso,
sobre a tumba de Agamenon, no drama elas ocupam o lugar do coro.
A
narração esta orientada desde Electra e marca o encontro com seu irmão Orestes.
Trechos belíssimos onde se reflete sobre a morte marcam o começo de este drama.
Fala do Coro no parágrafo 210.
“Corram, então, as nossas muitas lágrimas, pranto de morte ao nosso senhor morto neste refúgio
contra o mal e o bem (1) para apagar a mácula maldita, enquanto fluem estas libações. Ouve-nos!
Ouve, senhor excelente, o apelo de minha alma envolta em luto! Ai! Ai de mim! Que varão poderoso
virá livrar do jugo este palácio portando em suas mãos um arco cítio(2) e a espada cuja lâmina e o
punho confundem-se para lutar de perto?”
(1) Refere-se ao túmulo como um abrigo.
(2) Arqueiros conhecidos pela sua pontaria, vindos da Cítia (Euro - Ásia).
No drama destaco alguns momentos, Ésquilo nos mostra a imagem de dois filhotes de águias órfãs
para descrever a situação na que se encontravam Orestes e Electra.
Encontramos estes versos no parágrafo 325 na fala de Orestes:
“Zeus! Zeus! Vela por nós! Parecemos filhotes de uma altaneira águia, privados do pai colhido
e morto nos coleios, nos enlaces de alguma víbora maligna; sós e órfãos podem ser vítimas
da fome impiedosa, pois nos primeiros dias falta- lhes a força para trazerem caça ao ninho
onde nasceram. A nossa sorte — digo a minha e a de Electra — é a mesma: jovens, sem
a proteção paterna, ambos expulsos do palácio onde nascemos. Se permitires, Zeus, que
sejam destruídas estas crias de um pai que foi teu sacerdote e mais que os outros homens
cuidou de teu culto,
A seguir destaco no parágrafo 375 o momento em que se reproduzem as ameaças divinas
contra Orestes no caso ele não cumpra sua missão e vingue seu pai
“Ele falou também de ataques horrorosos das Fúrias (1)
sempre desejosas de vingança ao ver o sangue derramado
por um pai, e de visões terrificantes que aparecem
na escuridão da noite diante dos olhos dos filhos
desvairados entre convulsões.
O dardo negro (2) dos infernos, quando o invocam os mortos
consangüíneos — cólera, delírio ou pesadelos vindos do
fundo da noite ,
agita e enlouquece os filhos negligentes até conseguir
expulsá-los da cidade com as carnes ultrajantemente
laceradas por um irresistível aguilhão de bronze.
E a criatura que faltasse a tais deveres”..
(1) As Fúrias ou Erinias eram entidades incumbidas de vingar mortes de consangüíneos.
(2) As Fúrias usavam dardos como armas.
O Relato da continuidade com a chegada de Orestes, a narração é orientada desde ele,
Electra e o coro; a ação transcorre quando em determinado momento os protagonistas
se deparam com doações depositadas por Clitemnestra no túmulo de Agamenon,
curiosos por conhecer o por que do gesto ficam intrigados se a oferenda teria
algum tipo de remorso por parte da mãe assassina...a resposta vem na forma
de um anuncio premonitório relatando o que aconteceu durante um pesadelo
de Clitemnestra: a imagem de uma serpente recém nascida toma o leite materno
do próprio peito de Clitemnestra ao mesmo tempo que morde a mãe misturando sangue e leite.
Um dos méritos de
Ésquilo é que ele retoma varas imagens míticas trazendo os relatos da tradição
para sua literatura...Aqui vemos como em determinado momento o Coro cita a
historia de duas traições e de um casamento sem amor para enriquecer o relato
presente...
Primeiro relato: Altaia e seu filho, Melêagro: descrição que
conta que por
ocasião do nascimento de Melêagro as Moiras (1) surgiram à Altaia, sua mãe, e
lhe revelaram que a sorte do recém-nascido estava ligada à de um pedaço de
madeira que ardia na lareira na hora do nascimento, Melêagro morreria no dia em
que o pedaço de madeira se consumisse em brasas.
Altaia correu para a lareira, apanhou o tição e, depois de apagá-lo, guardou-o
num cofre cuidadosamente oculto. Chegando à idade adulta Melêagro tomou a decisão de livrar sua terra
natal do javali descomunal mandado por Ártemis .Atalante
realizou o primeiro ataque e ele junto com seus tios acabaram com o mostro.Num
acesso de cólera Melêagro depois de uma
desavenças matou os seus tios, assegurando a Atalante a posse dos despojos .
Indignada com o
assassínio de seus irmãos, Altaia, mãe de Melêagro, lançou no fogo o tição ao
qual estava ligada a vida de seu filho. Logo após Altaia arrependeu-se e
enforcou-se, sendo seguida em seu gesto por Cleópatra, mulher de Melêagro.
(1)
Moiras , necessidade ou
destino, eram
três mulheres responsáveis por fabricar,
tecer e cortar aquilo que seria o fio da vida de todos os indivíduos
Segunda historia citada é a de Cila referida por ter traído seu próprio pai, um oráculo havia dito
que Niso não morreria enquanto conservasse tiras de cabelo vermelho, escondidas em seu
cabeleira, Cila cedendo à sedução de algumas jóias de ouro cretense presentes de Minos
(inimigo do seu pai), corta os cabelos do pai garantindo assim a vitoria do Minos, este,
embora tenha se beneficiado dos favores de Cila achando que não poderia confiar em
uma mulher que comete semelhante traição amarrou-a a proa de seu navio, matando
a princesa por afogamento. Os deuses, apiedados dela, transformaram-na poupa de uma ave.
Em determinado momento o coro faz referencia a desgraça do que aconteceu com os
Lêmnios (Leminos) para exemplificar uma serie de crimes que aconteceram na
antiguidade perpetrados por esposas desrespeitadas contra seus conjugues.
No livro “Os mitos gregos” de Robert Graves no capitulo 149 se faz alusão ao relato ocorrido
em Leminos nos seguintes termos: Os homens de Leminos tinham se desavindo com suas
concubinas e feito suas esposas raparigas da Tracia. Para se vingarem as mulheres de
Leminos assassinaram a todos os homens sem piedade fossem estes velhos ou novos.
Ésquilo introduz este relato também com um exemplo de uma injustiça histórica que os
deuses não aceitaram e que seria vingada pelas forças das Fúrias.
Continua assim o relato da tragédia retomando a cena da chegada de Orestes para vingar
o sangue derramado.
Voltando ao drama, Orestes finalmente se faz passar por viajante que traz a noticia da
sua própria morte, com este pretexto consegue entrar no palácio e lá dentro mata sua mãe e o Egisto.
Atormentado por ter cometido matricídio, mas ao mesmo tempo satisfeito por ter vingado seu
pai se afasta do palácio
O Coro termina dizendo “O fim? A salvação? Onde se deterá, ou findará, a Ira precursora da vingança?”.
Eumênides.
A terceira parte começa com o relato de uma profetisa que descreve a cena na qual um
homem com sangue nas mãos é ameaçado por mulheres (Górgonas).
A cena se refere a Orestes que é protegido por Apolo e vigiado pelas Harpias para que pague pelo seu crime.
(na imagem uma Górgona decapitada .Caravaggio).
No verso 235, os monstros entram no templo de Apolo e este as expulsa:”Abandonai agora
mesmo a minha casa! Ordeno-vos! Deixai em paz o santuário onde proclamo profecias verdadeiras;
se não obedecerdes sereis atingidas pelas serpentes sibilantes de asas brancas (1) que, saltando
da corda de meu arco áureo, vos forçarão a vomitar entre estertores a negra espuma que deveis
a tantos homens e a expelir o sangue que sugastes deles! Esta casa, de fato, não é adequada
à vossa companhia. Não!
(1) Flechas.
Em outro momento (verso 445) o Coro descreve o canto das Fúrias de este modo:
“Em frente à nossa vitima cantamos um hino dedicado às sacras Fúrias, vertiginoso
e delirante, a ponto de provocar nos homens a loucura e de lhes imobilizar a mente
, canto sem os acordes de uma lira que os horroriza e os seca de medo. O ofício que
o destino inexorável fixou e nos impôs eternamente é perseguir todas as criaturas
lançadas por sua própria demência na via tortuosa do homicídio até descerem ao profundo
inferno; nem mesmo a morte as livrará da pena.
O relato incorpora um novo protagonista, alem de Orestes , Apolo e as Górgonas (na pele do Coro)
aparece Atena que escuta as duas partes e instaura um julgamento.
As partes são ouvidas, por um lado Orestes justificando seu crime e Apolo atuando
como sua testemunha de defesa enfrentados ao furor das Górgonas que exigem
a pena pelo matricídio.
Os juízes (entre os que se encontrava Loxias) faziam parte do tribunal.
Os argumentos centrais eram dois, por um lado a justificação de que
Clitemnestra o pai de Orestes e esse ato teria que ser vingado, e por outro
que o matricídio é um crime violento que não teria justificativa.
Um terceiro argumento aparece, este um pouco ligado a esse contato entre o mundo
dos homens e dos deuses, se trata de uma valorização do vinculo paternal, diz Apolo
:”Aquele que se costuma chamar de filho não é gerado pela mãe - ela somente é
a nutriz (1) do germe nela semeado -; de fato, o criador é o homem que a fecunda;
ela, como uma estranha, apenas salvaguarda o nascituro quando os deuses não
o atingem. Oferecer-te-ei uma prova cabal de que alguém pode ser pai sem haver
mãe. Eis uma testemunha aqui, perto de nós - Palas, filha do soberano Zeus olímpico -,
(2)que não cresceu nas trevas do ventre materno; alguma deusa poderia por si mesma
ter produzido uma criança semelhante”
(1) Nutriz: derivado de nutriente.
(2) Palas é Atenea; Isto por que Atenea teria nascido do pensamento de Zeus.
Em relação ao método dos votos que acontecem durante o julgamento, ela (Atena) desempatou
em favor de Orestes, a partir de este episodio o voto decisivo ficou conhecido ao longo da historia
como o voto de Minerva - Atenea ou Alas Atena era chamada de Minerva na cultura romana-.
O drama culmina então com a declaração de inocência de Orestes e com o esforço de reconciliação
de Atena para acalmar as Góngoras que em um primeiro momento tentaram amaldiçoar Atenas por
conta do resultado do julgamento.
O drama fecha a trilogia descrevendo de modo simbólico a luta interior que acontece no cerne
de Orestes, as Góngoras assim funcionam como uma espécie de consciência culposa e Apolo e
Atena como um marco de legalidade para inocentar Orestes e fechar o ciclo da maldição dos Atridas.
-0-0-0-
Electra de Sófocles.
Mais uma preciosidade da arte dramática.
A tragédia se situa no momento da chegada de Orestes a Atenas, Electra narra seu calvário e o
Coro formado por anciãs consola e colabora narrando os fatos.
Aparecem citações de mitos que alimentam a descrição, vou me referir a três:
A peça começa com estes versos :“ Filho de Agamenon, que outrora, em Tróia, os exércitos comandou,
a ti te é dado, enfim, contemplar em pessoa aqueles lugares por que sempre ansiaste! É esta a Argólida
(1)vetusta de que tantas saudades tinhas, e o bosque sagrado da filha de Inaco (2), atormentada pelo
moscardo”.
(1) Atenas
(2) Rio divinizado
Aqui fala de Io, filha do Inaco (ou Ínaco ao mesmo tempo deus e rio)
atormentada por um moscardo...
O mito
de Io.
Hera (esposa de Zeus) tinha ela
como sacerdotisa, fica enciumada com a
sedução de Zeus e a transforma em uma novilha branca, colocando ela aos cuidados de Argos Panoptes (gigante com cem olhos).
Zeus encarregou Hermes de libertar sua amada. Para isto, o
mensageiro dos deuses, usando a flauta de Pã,
pôs para dormir Argos, e corta sua cabeça. Hera recolheu os olhos de seu servo
e os pôs na cauda do pavão,
animal consagrado a ela.
Io estava livre do cativeiro, ainda assim o fantasma de
Argos continuava a persegui-la e para piorar sua situação, a deusa envia um moscardo para picar a novilha
constantemente durante sua fuga.
Continuando com a tragédia no verso 150 destacamos a presença de dois
mitos:
“Insensato é
aquele que se esquece de um pai morto
por forma lastimável. A mim, porém, ao meu coração é cara aquela que chorosa
Itis, Itis lamenta sem cessar, a ave de dor enlouquecida, de Zeus mensageira.
Ai, Níobe, de amarguras a rainha, eu te considero divina, a ti, que em teu túmulo de pedra choras sem
cessar”.
O mito do Rouxinol.
Lembrando o mito: No livro IV das metamorfoses Ovídio conta como Terreo casado com Procne sente desejos pela
sua cunhada Filomena, sem poder conter seus instintos , Terreo
encerra a Filomela em um lugar obscuro a
violenta e para evitar que fale corta a língua da sua vitima; Filomela presa faz uma mensagem em um tecido e o envia
a sua irmã. Sua irmã a libera, a fúria decidem se vingar, matamdo Itis; o filho
que Procne tinha com Terreo e serve suas entranhas para ele no jantar.
Elas
apresentam a cabeça do Itis como prova da vingança e Terreo as persegue com sua
espada, em este momento se produz a metamorfoses: Terreo é transformado em um gavião,
Procne é transformada em uma andorinha e Filomela em um rouxinol (o canto do
rouxinol era associado ao lamento).
Mito de Níobe.
Na ilustração a morte dos filhos de Níobe, por Abraham Bloemaert, 1591.
O mito narra a historia de Níobe.
Existe varias versões para o mito, uma delas descreve que Níobe mãe de 14 filhos foi punida por ter
cometido a indiscrição de ironizar Leto (uma das amadas de Zeus), que só era mãe de dois filhos,
Apolo e Artemis . Os Deuses ofendidos mataram seus 14 filhos com flechas.
Níobe desesperada se metamorfoseia em um rochedo que eternamente lagrimeja.
Dando continuidade ao drama ...Electra encontra sua irmã Crisótemis levando oferendas no tumulo
do Agamenon, questionada Clisótemis narra que Clitemnestra a envia em razão de um sonho onde
Agamenon ressuscitado empunhava um cetro muito antigo, ele o plantou na terra e daí surgira uma arvore.
Aparece Clitemnestra e discute com Electra justificando o assassinato do Agamenon.
Muda a cena, Orestes volta ao palácio para vingar a morte de seu pai fantasiado de forasteiro
trazendo a noticia da sua própria morte...Electra se desespera e o encontro de ambos resulta numa cena
dramática das mais belas da peça.
No fim Orestes acalma Electra e juntos planejam os últimos detalhes da vingança.
Aqui, para encerrar esta resenha uma mostra de como a tragédia grega esta envolvida pela
religiosidade e pelos mitos, destaco a fala do Coro momentos antes de Orestes matar sua mãe e ao Egisto:
“Avança agora a morte inexorável
querendo sangue! Acabam de transpor
As portas do palácio as negras Fúrias,
Perseguidoras lentas mas fatais
Da culpa tenebrosa. Em pouco tempo
Torna-se á em fim realidade
A nítida visão de nosso espírito.
O núncio das soturnas divindades
Insinuou-se na morada muito antiga
De seus antepassados nobilíssimos,
Tendo a morte constante em suas mãos.
Hermes , o filho ardiloso de Maia,
Dissimula na sombras a cilada
E mostra o rumo, o fim já se aproxima!”.
-0-0-0-0-
A Electra lhe cai bem o luto .
Eugene
j nO´Neill em um dos seus projetos mais ambiciosos retoma a narração do mito e
atualiza a cena recriando-la na guerra de secessão nos EE.UU em 1865.
Jorge Luis
Borges no prólogo da edição argentina comenta que: “O´Neill compreendeu que o melhor instrumento que lhe foi dado aos
homens para inovar e renovar é a tradição, não para servilmente
repetir-la ou copiá-la mas para que ela seja ramificada e
enriquecida”.
Marx falaria: “O
clássico não só continua proporcionando prazer estético, mas serve como modelo
e norma para a realização do novo”.
A peça de O´Neill e o paralelo formal com a tragédia de Esquilo.
O´Neill
ao modo de Esquilo divide o drama em três episódios.
A
primeira peça “O regresso ao lar” narra o retorno do general Ezra
Mannon (Agamenon) da guerra de secessão (guerra de Tróia) para sua mansão, onde
encontrará sua esposa adúltera Cristina (Clitemnestra) apaixonada pelo seu
amante Adams Brant (Egisto). Sua amada filha Lavínia (Electra) assiste
impotente a fatalidade inexorável que acontece com seu pai.
A segunda peça “Os acuados” narra o retorno do irmão de Lavínia,
Orin (Orestes), para vingar a morte do pai. A terceira peça “Os possessos”
explora os conflitos de culpa e castigo que atuam nos personagens.
As diferenças.
Como tínhamos comentado o motivo que provocou a morte de
Agamenon no clássico grego nos remete a duas causas: a maldição dos Atridas e
ao sacrifício de Ifigênia, assim o enredo narra o episodio no qual Clitemnestra
(esposa de Agamenon) atualiza a maldição e vinga a morte da filha matando-o.
Electra junto com Orestes por sua vez vingam a morte do pai matando
Clitemnestra e seu conjugue.
Clitemnestra e seu conjugue.
A
gamenon tem, na tragédia grega, motivos sagrados para ter cometido o sacrifício e ser vingado pela sua conjugue, no caso da obra de O´Neill o motivo também existe, mas é de natureza mais prosaica, a mãe de Lavínia mata o pai para viver uma nova relação amorosa e também para vingar o fato do seu marido ter levado seu filho para se alistar no exercito.
gamenon tem, na tragédia grega, motivos sagrados para ter cometido o sacrifício e ser vingado pela sua conjugue, no caso da obra de O´Neill o motivo também existe, mas é de natureza mais prosaica, a mãe de Lavínia mata o pai para viver uma nova relação amorosa e também para vingar o fato do seu marido ter levado seu filho para se alistar no exercito.
Orestes, irmão de Ifigênia, que efetivamente mata a
Clitemnestra em Sófocles aqui em O´Neill na pele do Orin mata ao conjugue da
mãe e esta se suicida.
No drama atual o amante da mãe (Brant-Egisto) também tem
motivos ancestrais para se aproximar de Cristina (em um paralelo com a maldição
dos Atridas). Resulta que seu pai, David Mannon se apaixona por Marie Brantôme,
uma enfermeira franco canadense que cuidara da irmã menor da família; os Mannon
discriminam a nora pela sua origem plebéia, esta tem um final trágico e Brant
guarda rancores contra Ezra Mannon por conta deste passado.
No final aparecem mais dois personagens que fazem pares
românticos, se trata de dois irmãos vizinhos da casa dos Mannon, Peter se
aproxima de Lavínia e Hazel de Orin
, mas o tormento provocado pela sucessão
de mortes inviabiliza a possibilidade de qualquer desdobramento amoroso.
A protagonista se chama Lavínia e parte de uma suspeita de
infidelidade de sua mãe para reconstruir um possível plano de assassinato que o
casal desleal poderia perpetrar contra seu pai.
O crime finalmente se realiza – A sua mãe envenena seu pai-
e ela, junto com seu irmão, vinga a morte do seu pai matando o amante da mãe.
A mãe se mata ao receber a noticia da morte do seu amante,
mas seu irmão se mata também aturdido
pela trágica situação que se criou; ela se afoga em penas e acaba se exilando na
sua própria casa.
A terceira parte esta marcada pela culpa e o castigo e ao
contrario da tragédia de Ésquilo os personagens não encontram perdão nem
redenção.
Historias mórbidas
Mãe e filha têm um parecido físico forte, existem relações
incestuosas sugeridas entre Lavínia e seu pai e entre Orin e sua mãe. No final,
citando seguramente patologias trazidas pela influencia do psicanálise da
época, aparecem várias ramificações de tom amoroso- sexuais inclusive entre
Orin e Lavínia ocupando diferentes papeis eróticos.
No final do drama Orin desenvolve uma obsessão depressiva
misturando culpas e ciúmes que acabam o levando ao suicídio.
Lavínia colabora de modo cruel com este final fúnebre e
também provoca perversamente ciúmes no seu namorado Peter determinando com seu
comportamento seu próprio isolamento trágico.
Descrição da
dramatização.
O´Neiil tinha nos seus escritos detalhes explícitos de como
ele indicaria a atuação, por exemplo, na peça ele aconselha com parêntesis o
tom com a que a personagem tem que interpretar: “ tratando
de conservar a calma, com voz tensa”, ou “a quem o horror lhe privou a fala, só pode emitir uma exclamação
entrecortada”.
Também delineia atitudes que as imagens provocam nos personagens,
isto ultimo o podemos perceber no caso quando o olhar de um retrato inquire na
consciência dos protagonistas aproximando aquela figura ao real influenciando o
drama: “os olhos dos retratos atraem aos
seus e se aproximam”.
As descrições do cenário, das luzes assim como a do
vestiário e a música se encontram definidos como uma precisão de alguém que
cuida de absolutamente todos os detalhes
cênicos, alguém que imagina a cena
e que sabe o que quer.
A máscara.
A alegoria da máscara recorrente em O´Neill ,se faz presente em vários sentidos,
por um lado é como uma marca, o fato de pertencer a uma família, os rostos dos
atores e a fachada da mansão familiar
tem a rigidez das máscaras: “Algo
segredo...como se tivesse uma máscara, uma marca dos Mannon”.
Por outro lado a máscara ocupa o lugar de uma copia: “Tem-se
de imediato a estranha impressão de que em repouso, não é carne viva, senão uma
pálida máscara que imita maravilhosamente a vida”...
Mais uma alegoria relacionada com a máscara: “A lua em quarto minguante projeta a luz
sobre a casa, lhe dando tonalidades irreais, longínquas, imponentes. A brancura
da fachada do templo se assemelha , mais do que nunca, uma incongruente
máscara, fixada sobre a sombria mansão de pedra”.
A máscara também com sinônimo de semelhança do real e do
representado: “Todos os rostos dos
retratos tem a mesma tonalidade de máscaras que a dos personagens vivos do
drama”.
Aqui descrevendo o cadáver de Ezra Mannon usa a imagem da
máscara como uma imitação distante do verdadeiro: “Seu rosto de máscara é uma surpreendente reprodução do rosto do
retrato; mas sombriamente longínquo e austero na morte, como o esculpido rosto
de uma estatua”.
Aqui a máscara mais como uma duplicidade que oculta algo
pior do que é visível: “Baixo a máscara
do seu rosto há profundas rugas”.
Em fim em O´Neill
esta imagem desenvolve vários atributos e significados ampliando o
conceito de máscara elevando seus simbolismo e suas possibilidades.
Final.
Electra representa o amor puro e verdadeiro de uma filha
pelo pai, em termos gerais o feminino relacionado com a paternidade; a lenda
que vem sendo citada desde Homero se associa
também a idéia de vingança ; este sentimento de amor e ódio fez que sua
figura fosse reinventada e retomada por todas as formas artísticas existentes.
O mito inspirou a milhares de artistas, assim, cada vez que
toquemos no tema do amor feminino pelo pai sua imagem renascera e teremos
Electra de novo na nossa frente como uma referencia viva e intensa. Electra,
uma jovem mulher lutando pelo amor.