domingo, 14 de julho de 2019

O Castelo de Yodo


Yasushi Inque


O Castelo de Yodo

Existiu uma época no período Edo onde expressar abertamente um sentimento era considerado vulgar.


Quem acompanha meu blog teve, nas ultimas publicações, um panorama mínimo de quatro autores fundamentais da literatura japonesa: Falamos sobre o conto poético de Yasunari Kawabata “A Dançarina de Izu”, do romance intimista “O Portal” de Natsume Sōseki e da obra de Tanizaki : “A gata, um homem e duas mulheres” e “o cortador de Juncos”.Já tínhamos comentado o livro de Yasushi Inque “O fuzil de caça”, um romance atual no qual, um triangulo amoroso é narrado desde três perspectivas diferentes; do mesmo autor hoje vamos falar sobre o romance épico: “O Castelo de Yodo”.

O livro.


Basicamente estamos ante um retrato histórico da aristocracia japonesa do século XVI a historia é narrada desde a perspectiva feminina de uma princesa, a descrição ganha em detalhes sobre a vida da época, os sentimentos e a fúria na qual conviviam submetidos e dominadores.

O nome do livro.


O título em português é  “O castelo de Yodo”.
Chacha ao aceitar ser concubina do algoz da sua família solicitou que Hideyoshi construiria um castelo para ela mesma, isto serviria para, de alguma forma, compensar suas perdas e por outro serviria como termômetro para avaliar sua influencia sobre seu futuro cônjuge.
Yodo é o nome do lugar onde foi construído o castelo. No romance Chacha também é conhecida como a “a dama de Yodo”.
O título japonês O diário de Yodo-dono faz menção aos diários escritos por nobres. Além da curiosa referência histórica, a idéia de que o romance é o diário de Chacha, e podemos considerá-lo, foi uma intenção precisa no quesito do protagonismo ser feminino.


O contexto histórico.  


Japão, século XVI, O livro relata um momento no qual se sucederam três lideranças.  Período Azuchi-Momoyama (1573-1603) o general Toyotomi Hideyoshi, que servira Nobunaga, sucedeu seu antigo senhor.
Chacha princesa de alto escalão acaba virando concubina de Toyotomi Hideyoshi, o homem que matou sua família e tornou-se após a morte de Oda o homem mais poderoso do Japão, com ele tem um filho chamado Hideyori, no final do relato o romance narra à luta de Chacha para que Hideory fosse o sucessor do pai, mas as forças de Tokugawa derrotaram o clã de Hideyoshi, levando a morte de Chacha e de Hideyori, seu filho.

A poesia e a barbárie no texto.

O tom poético, elemento importante da literatura japonesa, fica por conta dos momentos íntimos, dos pensamentos e da contemplação da natureza.
Ao contrario o lado atroz o encontramos na crueldade com que são tratados os prisioneiros de guerra, quase sempre exterminados de forma fria e sádica. Muitas vezes obrigados a cometerem suicídio em um ato chamado seppuku.
Aqui alguns exemplos destes dois sentidos:
Do sentido poético.
Na infância de Chacha ocorre uma cena curiosa: Um pintor fazia um retrato de seu falecido pai , o artista ia e voltava com resultados parciais, a mãe esperava ver o olhar sereno de seu defunto esposo na pintura, Sacha ao contrario não encontrava no esboço o olhar severo de seu pai. Mãe e filha ponderam sobre qual das imagens pessoais se aproxima mais do verdadeiro.
Agora um exemplo da arte japonesa: no vestido de noiva da mãe de Chacha ela veste um quimono branco com o emblema saiwaibishi.





Outro exemplo do poético no texto o encontrou quando a mãe de Chacha e seu conjugue sofrem um ataque militar no seu castelo e se preparam para a cerimônia do suicídio. Ela escreve: “Na já sonolenta noite de verão/ ao caminho dos sonhos/ convida o rouxinol. E seu marido responde:” Na triste noite de verão/leva minha amada/ pelo caminho dos sonhos/À fonte das neves/Ó rouxinol das montanhas”.
Do sentido desumano.
As descrições sádicas incluem cortar cabeças e colocar-las como enfeite nas festas, incendiar, destruir e exterminar.
Um outro exemplo de uma violência desnecessária o encontramos na passagem na qual um guerreiro chamado Morimasa estava sendo especialmente procurado durante o período de guerras, ele sempre conseguia atacar e fugir sem poder ser localizado.
Um grupo de 12 camponeses consegue prender o combatente e quando entregam o prisioneiro ao Hideyoshi este manda crucificar os camponeses por terem se envolvido em historias de samurais, que não lhe diziam respeito.

As historias paralelas.


A diferença de um conto, um romance longo como este, narra uma historia e ao mesmo tempo tece uma infinidade de historias secundarias.
Neste livro temos, por exemplo, a historia das irmãs da ChaCha, a de seus amores platônicos, a relação dela com as outras concubinas em especial com sua prima Kyogoku e com a esposa oficial de Hideyoshi: Kitanomandokoro .
A luta para engravidar e a morte do seu primeiro filho.
A sua eterna solidão ao ser uma mulher em um sentido prisioneira luxuosa de um dono todo poderoso.
As imagens que a perseguem e torturam desde a infância quando teve que sair da sua casa no meio das chamas.
As cerimônias, as festas e os rituais pomposos da sua vida aristocrática.

Os cortejos.


Uma coisa que surpreende é a magnificência dos cortejos, vamos citar um deles: “O cortejo avançava lentamente na brisa de maio. Em duas fileiras , vinham 300 baús; logo atrás, homens carregando espadas, lanças e fuzis. Os vassalos traziam mantos vermelhos e punhais. Em seguida vinham cães vestidos de brocado...”

Final.


Neste romance épico estão reunidos também todos os ingredientes para um grande afresco histórico. 
Yasushi Inque descreve como o era o estatuto das concubinas, o estilo de vida da aristocracia, as tradições guerreiras, a política, a cerimônia do chá e até o belo ritual da florada das cerejeiras.
O Castelo de Yodo é um mosaico de uma época na qual uma mulher tece o percurso de três unificadores, recomendo esta bela ficção inspirada em fatos reais.