domingo, 30 de dezembro de 2018

A Dançarina de Izu.


A Dançarina de Izu.

O conto poético de Yasunari Kawabata faz honras ao pensamento que valoriza a brevidade e a beleza.
Em 60 paginas o autor nos revela impressões da natureza, dos sons do tambor, dos gestos do amor fugaz e do efêmero dos sentimentos juvenis.
A delicadeza narrativa reflete bem a concepção singela da arte oriental.
A edição brasileira da editora “Estação Liberdade” traz alem do conto um capítulo feito com extrema delicadeza pela professora Meiko Shimon dedicado a descrição da literatura japonesa do século XX  no qual se insere Kawabata e por fim uma cronologia sobre sua vida.

 O autor.

Uma vida marcada por perdas fundamentais na sua infância não impedem que o autor realize uma vida artística brilhante com todo esse desamparo.
Sua obra chega a conhecer a celebridade ao ganhar o premio Nobel de literatura.
Sua concepção de arte o leva a valorizar a “beleza revelada na fragilidade e fugacidade da impermanência”.

A historia.

Um estudante de 19 anos viaja pelo interior do Japão se hospedando em pequenas pousadas, no percurso conhece um grupo de artistas peregrinos, compartilha o passeio com o grupo e desenvolve uma atração platônica por uma artista de 13 anos.
O tema do amor impossível e o misterioso alimentam a trama. 

O pincel.  

Neste conto a descrição das cores ganha uma importância especial, Kawabata similar a um pintor fala de “pentes com cor de pêssego” e de “arvores amareladas”; ou nos apresenta  imagens sonoras como : ”as vozes das mulheres pareciam trovões atravessando o céu azul”.
A sexualidade sutil passa do olhar malicioso ao sorriso purificador: “Observando suas pernas senti meu coração em êxtase , era uma criança exibindo seu corpo ao sol, tomado por um caloroso prazer , continue a sorrir “.
 Teve várias versões cinematográficas, sendo a primeira de 1933, sob a direção de Heinosuke Gosho. Aqui o link do filme
Recomendo esta pequena grandiosa obra de arte.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Os Prêmios de Cortazar.


Os prêmios.

Cortazar escreve este seu segundo romance publicado em 1960, antes do Jogo da Amarelinha. Ao longo das 164 páginas assistimos em tempo real os três dias que dura uma viagem em barco que termina de forma trágica.

O estilo.

Como é recorrente no estilo de Cortazar sempre existe um “outro lado”, tudo é nebuloso. No livro os personagens ganham como recompensa de um sorteio uma viagem em barco, mas eles não conhecem o destino do passeio e ainda para alimentar o clima ambíguo dos fatos, os tripulantes, aparentemente suecos ou finlandeses, não se comunicam com os passageiros e por esse comportamento estranho recebem o apelido de glúcidos.
Mas o que provoca o núcleo dramático é que dentro do barco os passageiros não podem passar da proa para a popa, este fato faz que eles nutram pareceres imaginários desse outro lado desconhecido e este é justamente o conflito que alimenta o ritmo narrativo.
Como acontece no conto “A casa tomada”, não existe um perigo real, apenas uma ameaça ou uma interdição que provoca a fantasia dos passageiros e que precipita o final trágico.

A trama.

A cena ocorre em Buenos Aires, no relato um grupo de pessoas ganha uma viagem em um sorteio. Existe uma primeira confraternização (no bar London) onde se apresentam os personagens; depois como diz o próprio romance entramos em uma espécie de detenção do tempo: “um adiamento do futuro”; os passageiros entram no barco (O Malcolm) sem saber o rumo; uma das hipóteses é Liberpool , mas a partida se interrompe e o barco fica ancorado em Quilmes ( há uns 20 km de Buenos Aires). A viagem recomeça e o autor dedica várias páginas a descrever a beleza de uma dama ruiva, o corpo de um adolescente, o romance de um casal e a vida plana dos passageiros dividida entre a piscina, o bar e os camarotes.
A narrativa não tem um protagonista único, são vários os personagens, eles se apresentam em duplas: o casal Nora e Lucio na sua intimidade; Claudia com seu filho Jorge, Gabriel Medrano e Persio, Raul e Paula; o senhor Trejo e Felipe, Nelly e sua mãe (dona Pepa) , Pelusa ( Atilio Presutti), Carlos Lopez, o doutor Rastelli e Don Galo.
Os passageiros são impedidos de circular livremente pelo barco devido a um rumor de tifus; isto provoca que um grupo decida romper o cerco e invade a parte proibida do barco; ocorre um enfrentamento, morre um dos tripulantes e um passageiro. A viagem é irrompida pela polícia que impõe que o relato oficial oculte a morte do passageiro. Alguns se revoltam com a falsidade, mas acuados aceitam a versão oficial e voltam a suas vidas normais.

Persio.

  Um dos personagens mais originais é o Persio, ele funciona como uma espécie de pretexto para que Cortazar rompa o discurso narrativo e se permita entrar em um território mais livre, em outra dimensão como o próprio autor confessa. Aqui alguns dos seus monólogos:
“ Aprovechando el diálogo materno-filial Persio piensa y observa en tornó, y a cada presencia aplica el logos o del logos extrae el hilo, del meollo la fina pista sutil con vistas al espectáculo que deberá —asi él quisiera— abrirle el portillo hacia la síntesis. Desiste sin esfuerzo Persio de las figuras adyacentes a la secuencia central, calcula y concentra la baza significativa, cala y hostiga la circunstancia ambiente, separa y analiza, aparta y pone en la balanza. Lo que ve adquiere el relieve que daría una fiebre fría, una alucinación sin tigres ni coleópteros, un ardor que persigue su presa sin saltos de mono ni cisnes de ecolalia. Ya han quedado fuera del café las comparsas que asisten a la partida (pero, de juego se habla ahora) sin saber de su parada. A Persio le va gustando aislar en la platina la breve constelación de los que quedan, de los que han de viajar de veras. No sabe más que ellos de las leyes del juego, pero siente que están naciendo ahí mismo de cada uno de los jugadores, como en un tablero infinito entre adversarios mudos, para alfiles y caballos como delfines y sátiros juguetones. Cada jugada una naumaquia, cada paso un río de palabras o de lágrimas, cada casilla un grano de arena, un mar de sangre, una comedia de ardillas o un fracaso de Juglares que ruedan por un prado de cascabeles y aplausos. Así un municipal concierto de buenas intenciones encaminadas a la beneficencia y quizá (sin saberlo con certeza) a una oscura ciencia en la que talla la suerte, el destino de tos agraciados, ha hecho posible este congreso en el London, este pequeño ejército del que Persio sospecha las cabezas de fila, los furrieles, los tránsfugas y quizás los héroes, atisba las distancias de acuario a mirador, los hielos de tiempo que separan una mirada de varón de una sonrisa vestida de rouge, la incalculable lejanía de los destinos que de pronto se vuelven gavilla en una cita, la mezcla casi pavorosa de seres solos que se encuentran de pronto viniendo desde taxis y estaciones y amantes y bufetes, que son ya un solo cuerpo que aún no se reconoce, no sabe que es el extraño pretexto de una confusa saga que quizá en vano se cuente o no se cuente”.
Ou: “Conozco los olores de la calle Paraguay, y también Godoy Cruz de Mendoza, donde la brújula del vino corre entre gatos muertos y cascos de cemento armado. Hubiera debido mascar coca en cada rumbo, exacerbar las solitarias esperanzas que la costumbre relega al fondo de los sueños, sentir crecer en mi cuerpo la tercera mano, esa que espera para asir el tiempo y darlo vuelta, porque en alguna parte ha de estar esa tercera mano que a veces fulminante se insinúa en una instancia de poesía, en un golpe de pincel, en un suicidio, en una santidad, y que el prestigio y la fama mutilan inmediatamente y sustituyen por vistosas razones, esa tarea de picapedrero leproso que llaman explicar y fundamentar. Ah, en algún bolsillo invisible siento que se cierra y se abre la tercera mano, con ella quisiera acariciarte, hermosa noche, desollar dulcemente los nombres y las fechas que están tapando poco a poco el sol, el sol que una vez se enfermó en Egipto hasta quedarse ciego, y necesitó de un dios que lo curara”.
Aquí um trecho onde explora a imagem de um quadro de Picasso: “Tal vez sea necesario el reposo, tal vez en algún momento el guitarrista azul deja caer el brazo y la boca sexual calla y se ahueca, entra en sí misma como horriblemente se ahueca y entra en sí mismo un guante abandonado en una cama. A esa hora de desapego y de cansancio (porque el reposo es eufemismo de derrota, y el sueño máscara de una nada metida en cada poro de la vida), la imagen apenas antropomórfica, desdeñosamente pintada por Picasso en un cuadro que fue de Apollinaire, figura más que nunca la comedia en su punto de fusión, cuando todo se inmoviliza antes de estallar en el acorde que resolverá la tensión insoportable”.

A sedução.

O desejo e o sexo aparecem várias vezes: nas imagens oníricas de uma masturbação, na descrição de Paula como uma mulher ruiva, sedutora que atrai os olhares de toda a embarcação e do Felipe um jovem de 16 anos que acorda desejos no personagem de Raul e que se envolve em uma situação sedutora com Bob, um dos marinheiros.
Queria remarcar que é a primeira vez que me confronto com uma descrição homossexual em Cortazar.

A organização interna.

Temos um Prólogo, depois começam a ser contados os dias da viagem, assim temos o primeiro dia,. segundo, terceiro , um epilogo e uma nota do autor onde Cortazar comenta, entre outras coisas, a falta de planos com a que foi construída a obra.
O romance abre com uma citação do Idiota de Dostouevski: ”¿Qué hace un autor con la gente vulgar, absolutamente vulgar, cómo ponerla ante sus lectores y cómo volverla interesante? Es imposible dejarla siempre fuera de la ficción, pues la gente vulgar es en todos los momentos la llave y el punto esencial en la cadena de asuntos humanos: si la suprimimos se pierde toda probabilidad de verdad”.

Final.

Cortazar experimenta a ruptura com o discurso “normal” literário e se aventura em sequências aparentemente inspiradas nos surrealistas ou no improviso do jazz.
O argumento nos apresenta uma historia simples, em aparência, mas detrás da qual subjazem temas mais profundos: O tema do desconhecido, aquilo que não podemos alcançar, também a crítica ao patriotismo vazio, aos lugares comuns, ao temor da imagem social, ao conformismo com os valores estabelecidos, a cobardia e a superficialidade, ao preço que há que pagar por o valor ou por quebrar as grades.