Salinger
“O apanhador no campo de centeio”
A primeira coisa que nos chama a atenção quando começamos a
ler o romance é como o narrador nos convida a entrar na sua mente e colocar-nos
na cena, nos seus gestos, como que nos
põe por dentro do seu motor, do seu modo de pensar e de agir.
Em tom de confissão, de sessão terapêutica, o relato nos
convida a olhar o mundo detrás dos olhos do Holden.
A ação acontece quase que em tempo real, são três dias
sucessivos que ocorrem desde que o protagonista sai expulso da sua escola e decide
demorar uns dias em New York e realizar
uma aventura nas vésperas do Natal antes de voltar em casa.
O romance se passa em
dezembro de 1949. A história começa com Holden Caulfield , o protagonista, descrevendo
sua convivência com alunos da escola do Pencey Prep, em Angerstown, Pensilvânia.
Basicamente
é um monologo interior de Holden, um garoto de 16 anos, que não consegue se encaixar na realidade
imposta pelo sistema. Inconformista, foi
expulso de vários colégios e como tem hábitos literários (gosta do grande Gatsbi,
por exemplo) consegue tirar boas notas apenas em redação.
Ele critica aos professores
por serem superficiais, ou, como ele diria, “falsos”, vive como um estranho
nesse mundo de afetações e mentiras e
sua lucidez e que o torna atraente.
Ele é alto,magro, tem parte
de seu cabelo cinza (detalhe que ele explora para aumentar a sua idade), sofre
de tédio e de depressão,tem valores éticos-morais, reconhece o que é e nos
demonstra sua sensibilidade social, presenteia com alguns dólares a umas
freiras que estavam em apuros e se preocupa em onde ficariam as aves do central
park em inverno, isto aparece como uma obsessão e como uma metáfora do tema
social, como se ele com isso se preocupasse com os mais fracos....onde vão os patos
do lago no inverno?Ele questiona.
Pela própria torpeza da sua juventude Holsen produz
caos em diferentes ocasiões, mostra sua imaturidade ao não ser discreto em relação ao seus ciúmes , assim agride e é
agredido ao cair na briga com seu
companheiro de quarto por conta de uma garota , outro caso acontece pelo fato
de beber descontroladamente em uma oportunidade ele é convidado a sair de uma
casa noturna, em outro momento comete a imprudência de chamar uma antiga
namorada a horas inoportunas,se apresenta com nomes falsos e inventa como o
personagem do romance “a fome” de Hansun mentiras em relação a sua vida.
Um personagem real.
Assim como o Tom Sawyer de
Mark Twain o nosso protagonista é um
personagem real, com suas contradições, suas falhas, isto ,de repente, é o que
o torna fascinante e é o que fizera que cento de leitores pudessem se
identificar nas cobardias, nos excessos e no olhar de Holden.
Pensemos na sociedade
moralista americana, pensemos o que significou para os jovens, na época em que
foi lançado, 1951, seguramente uma carta de liberdade, um canto ao livre-arbítrio
da ação e dos pensamentos que eles até aquele momento nunca tiveram em nenhum
tipo de manifestação artística.
A relação com sua irmã e o encontro com um ex-professor.
O romance estava um pouco
monótono, vômitos, questões adolescentes, palavrões, tédio instalado até o
encontro do protagonista com sua irmãzinha e com um ex-professor, ai se
levantam duas questões fundamentais que nos apresenta o autor.
Em determinado momento ela
pergunta pra ele: mais ao final você gosta de que? Pergunta fundamental para
perfurar nosso jovem, ele respondeu que gostava dela, reconhecendo seu afetivo
e sua cumplicidade com ela como valor, falou também que gostaria sair da cidade
e mudar de vida, algo como “cair fora” sem saber bem onde.
A segunda questão que aparece
depois do encontro com a irmã ocorre quando o protagonista visita a um ex-professor
e em determinado momento discutem certo método de avaliação estética que era
praticado na escola.
A reivindicação do
adolescente de permitir o direito a se sair de um tema, de aceitar a dispersão dentro de um discurso
lineal parece como uma possibilidade de lucidez e de espaço para a criatividade,
apostando no talento , entendendo a
associação livre de idéias como uma
forma de perder as estribeiras e se permitir abrir o acaso como possibilidade
criativa.
Juntando isto com a
historia de o suicídio de um aluno, das
falsidades dos professores das escolas que ele freqüentou, dos questionamentos
a Holiwood tratando a industria do cinema como uma máquina esmagadora e ao
capitalismo como um sistema que vende ideais de consumo podemos afirmar que um dos valores do romance se
baseia em que este levanta as bandeiras contra o projeto americanizaste de
existência.
Técnica.
O narrador intradiegético nos deixa com a sensação de um tom confessional;
a falta de ação se apresenta como pano de fundo para expor pensamentos e
sensações do protagonista ;pequenas anedotas como a da prostituta, a ida ao
teatro ou a imagens no museu enfeitam o tédio
e a solidão de horas aziagas.
A música.
A música ocupa um lugar na
discrição dos ambientes, o narrador em alguns momentos cita discos, composições
e até descreve grupos e instrumentistas que ele assiste ao vivo, cita, por
exemplo,a performance de um pianista e um percussionista com luxo de detalhes.
O titulo.
The Catcher in the Rye ou o apanhador no campo de centeio , naturalmente um
titulo intrigante; uma primeira questão que se levanta esta ligada ao porque do
nome que dá título ao romance.
O livro leva esse nome em razão de Holden ter tido uma imagem fantástica
onde ele se vê como um apanhador num campo de centeio, um guardião das crianças
que se perdem a beira de um abismo sem volta, ou seja, como o guardião da perda da inocência infantil.
Minha interpretação.
O narrador revela, de algum
modo com este titulo obscuro, tipo parábola, como o próprio livro pode ser uma
espécie de salva vida para toda uma geração de jovens.
Comentários.
Transcrevo aqui o texto
de, A. Rocha e J. Dauster;"The Catcher in the Rye": (Penguin
Books, 1994)
O próprio título
passou a ter vida própria. Quem vai ao livro, chega até quase o seu final
sem vislumbrar alguma explicação. Finalmente, o protagonista cita o
poema que o inspirara ("Coming
Through a Rye", R.Burns, Escócia,
1759-1796) e tudo parece que vai se esclarecer. Quando, porém, relata a
espécie de "sonho em vigília", disparado pela lembrança dos
versos, aquilo que, a princípio, parecia apenas uma charada, ganha
contornos de absurdo, dignos da quase transposição do umbral da
loucura:
"Fico
imaginando uma porção de garotinhos brincando de alguma coisa num baita campo
de centeio e tudo. Milhares de garotinhos, e ninguém por perto---quer dizer,
ninguém grande--- a não ser eu. E eu fico na beirada de um precipício maluco. Sabe o que tenho que
fazer? Tenho que agarrar todo mundo que vai cair no abismo. Quer dizer, se
um deles começar a correr sem olhar para onde está indo, eu tenho que aparecer
de algum canto e agarrar o
garoto. Só isso que eu ia fazer o dia todo. Ia ser só o apanhador no campo de
centeio e tudo. Sei que é maluquice,
mas seria a única coisa que eu queria fazer. Sei que é maluquice...."
Uma tradução livre de alguns dos versos do poema talvez ajude: "...Jenny está toda molhada, pobre criatura./Jenny raramente está seca:/ Elameou todos os seus corpetes/Atravessando o campo de centeio!/Atravessando o campo de centeio, pobre criatura,/ Elameou todos os seus corpetes.../Quem encontra um semelhante/Atravessando um campo de centeio,/Deve beijar esse outro ser/Uma criatura tem que chorar?..." Quem esperava por alguma explicação linear, decepcionou-se.
Uma tradução livre de alguns dos versos do poema talvez ajude: "...Jenny está toda molhada, pobre criatura./Jenny raramente está seca:/ Elameou todos os seus corpetes/Atravessando o campo de centeio!/Atravessando o campo de centeio, pobre criatura,/ Elameou todos os seus corpetes.../Quem encontra um semelhante/Atravessando um campo de centeio,/Deve beijar esse outro ser/Uma criatura tem que chorar?..." Quem esperava por alguma explicação linear, decepcionou-se.
Excelente!!!!
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