sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Cortazar.....Bestiario

Bestiario (1951)

 Existem leituras indispensáveis, leituras necessárias, leituras nas quais a gente volta depois de muito tempo e sempre consegue olhar aquilo como se fosse algo novo.
Bestiário é o primeiro livro de contos de Cortazar nele se encontram os textos


1.                  Casa tomada
2.                  Carta a una señorita en París
3.                  Lejana
4.                  Ómnibus
5.                  Cefalea
6.                  Circe
7.                  Las puertas del cielo
8.                  Bestiario

O Fantástico
Estamos falando de um Cortázar  influenciado pelo psicanálise e o surrealismo , estamos falando de uma época em que a idéia de ruptura e de fazer uma arte mais experimental era algo necessário, tínhamos exemplos na música com Charlie Parker ou Piazzolla , no cinema com Luis Buñuel , na pintura, na literatura incorporando  elementos imaginativos dentro da narração linear  ...  A idéia de Cortázar para construir estas narrações se produz quando a partir de um mundo real, admissível  ele faz aparecer um outro lado que podemos chamar de mundo inverossímil .. O próprio autor nas suas reflexões coloca  ...Se pensamos em Bestiário, parece lícito propor num primeiro momento a (re)presentação de uma Realidade na qual termina,  serve de parâmetro ou anverso é “outra realidade” possível, insinuada e latente: “mais secreta e menos comunicável”.
 Cortázar esta expondo a convivência de duas ordens diferentes, distintas mais que estão num mesmo plano - paralelo , superposto ou com zonas de coexistência.
Não se trata de algo fantástico, tipo pessoas com poderes sobrenaturais,  animais extraordinários, ou  acontecimentos similares aos que ocorrem ao longo das páginas do conto das mil e uma noites por exemplo...estamos falando de uma narração onde a realidade é atravessada por um fato que nos comunica com algo inaceitável mais que neste novo contexto nos cria uma dualidade que acolhemos. Similar aos fatos  que encontramos no Edgar Allan Poe, no  seriado “acredite se quiser” ou no conto Don Casmurro do bruxo de Laranjeiras Don Machado de Assis.....

Casa Tomada
O conto “Casa tomada” foi publicado pela primeira vez, em 1946, na revista “Los anales de Buenos Aires”, dirigida por Jorge L. Borges. No “Prólogo” ao volumem de contos dedicados ao Cortázar da coleção “Biblioteca pessoal”,  Borges narra o encontro com o  jovem escritor e publica um pequeno comentário sobre o conto e sobre o volumem todo: “O tema de aquele conto é a ocupação gradual de uma casa por uma invisível presencia. Em ulteriores momentos Julio Cortázar  retoma de modo más indireto e por conseqüência mais eficaz este tema” (Borges: 1985).
Metáforas
Cortazar abre a possibilidade, respondendo a um jornalista, sobre a possível interpretação de que as presenças que invadem a casa pudessem ser entendidas como forças imaginariam representativas de forças repressoras políticas na Argentina.
O enredo
A historia do conto “Casa Tomada” é a de uma casal de irmãos com uma vida pacata, compartilhando seu tempo entre o ócio e o dia a dia dos fazeres  domésticos. Uma noite barulhos estranhos  nos fundos da casa os fazem fugir para a parte dianteira.Tentam retomar suas costumes, até serem surpresos por um novo alerta que acaba os expulsando pra rua. O argumento de “Casa tomada” coloca ao leitor na situação de perplexidade entre estes dois mundos, um realista e um outro lado insinuado e estranho que permeia o mundo do autor.
Carta a una señorita en Paris
Em “Carta a uma garota em Paris”, o elemento estranho se dá quando um dos protagonistas narra com naturalidade o fato de que ele vomita coelhinhos.
Lejana
No terceiro conto, “Longínqua” , uma mulher imagina ou sonha com uma mendiga em Budapest, se encontram e se fundem e se separam como se fossem a mesma.
“Le pareció que dulcemente una de las dos lloraba. Debía ser ella porque sintió mojadaslas mejillas, y el pómulo mismo doliéndole como si tuviera allí un golpe. También elcuello, y de pronto los hombros, agobiados por fatigas incontables. Al abrir los ojos (talvez gritaba ya) vio que se habían separado. Ahora sí gritó. De frío, porque la nieve leestaba entrando por los zapatos rotos, porque yéndose camino de la plaza iba AlinaReyes lindísima en su sastre gris, el pelo un poco suelto contra el viento, sin dar vueltala cara y yéndose”.
No quarto conto, “Ônibus” apenas um clima de olhares e de pressentimentos.... o constrangimento gratuito que sofre um casal durante uma viajem cotidiana num “auto – bus” serve como ambiente e pretexto para criar uma narração onde a incompreensão se instala, onde o mecanismo real/ outro real se faz presente.

No quinto conto “Cefalea”
Em “Cefaléia” (sexto conto), “Dor de Cabeça”, a vida dos personagens – inclusive a do narrador - está regida pela cria de mancuspias (animais estranhos). Nesse contexto em que se manifesta novamente una força estranha governada por leis desconhecidas que atormenta aos protagonistas com fortes dores no crânio.
No sexto conto, “Circe” acontece algo diferente, este é o único conto sem essa dualidade fantástica mais onde temos uma dualidade relacionada com uma suspeita....o protagonista desconfia que a sua noiva quer envenenar ele e se cria todo um jogo de intrigas.violência surda e ameaças a partir do convite para experimentar bombons...
Circe era na mitologia grega um Deusa feiticeira O conto começa com uma citação do poeta inglês Dante Rossetti onde se alude a uma situação de envenenamento.
Nas “Portas do céu” Cortazar descreve o ambiente do tango, a vida popular de Buenos Aires e entre a sedução, a fumaça e a perda de sua mulher amada o protagonista a vê aparecer como se abrisse a porta do céu para ela voltar por  alguns instantes.
Em “Bestiario”,  conto que dá título ao livro todo, os habitantes da casa de Funes vivem pendentes da presença absurda de um tigre que rege cada um dos movimentos da casa.
O perigo latente se compartilha com o cotidiano de crianças brincando de estudar as formigas e outros insetos.
Final
O próprio autor confessa que os contos incluídos no livro  Bestiario foram autoterapias ...mais o que chama a atenção fora a motivação pessoal de colocar pra fora suas obsessões é como ele cria um tipo de narrativa onde temos um final sempre aberto,  em quase todos eles faltam poucas linhas e descobrimos que não temos um ponto final que feche a historia...o leitor tem que ler e reler o conto para poder decifrar nas entrelinhas como se reconstrói esse verdadeiro quebra cabeças feito de insinuações e pegadas sempre indiretas....
No total um livro que lança ao Cortázar como um genial narrador e o coloca definitivamente entre os grandes escritores latino-americanos de todos os tempos..recomendo estes contos....







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